domingo, 21 de setembro de 2014

O Vendedor de Pentes

A maneira como um indivíduo arranja as palavras ganhar e vida na frase revela muito de como eles enxergam a existência, o que cada um deseja; pessimistas querem ganhar da vida, ambiciosos ganhar na vida, esforçados ganhar a vida e miseráveis ganhar vida. Nosso vendedor é um homem que ganha a vida vendendo pentes.  Todo dia ele levanta da cama às quatro e trinta e dois da manhã (o despertador está ajustado para tocar as quatro e meia, mas ele passa alguns minutos se espreguiçando). Toma um banho, toma um café, prepara seu lanche e prepara sua cesta de pentes. Calça seus chinelos azuis da sorte (ele só tem esse par de chinelos) e segue seu caminho em direção ao trabalho.

São cinco e quinze da manhã. Na praia, há apenas areia, o mar, ele, conchas, sujeira e algumas pessoas. Ele sorri, é um grande dia. Se aproxima de uma mulher. Uma potencial cliente, a primeira do dia talvez. Afinal, todo mundo precisa de um pente. Ela usa um casaco rosa, um boné branco, tênis de corrida e um aparelho do qual sai música conectado aos ouvidos. Ele corre ao seu lado. Bom dia atleta! O que você acha de comprar um pente? Tenho diversas cores, inclusive rosa. Ela fez um gesto negativo com a mão aberta. Provavelmente nem ouviu o que ele disse. Outros clientes virão.

Aos poucos, a praia vai se enchendo de pessoas. Ele se aproxima de um jovem garoto de boné. O garoto fazia um castelo de areia a beira do mar, naquela região onde a maré chega apenas as vezes. Ei menino! O que acha de comprar um pente? O garoto respondeu que não tinha dinheiro, pois tinha apenas seis anos de idade. Tentou mudar seu público alvo e foi em direção ao pai, que olhava desconfiado de uma cadeira a alguns metros. Usava óculos escuros, trajava bermuda florida e vestia um imponente bigode. Belo dia senhor! Um dia melhor ainda para se comprar esse belíssimo pente de cabelo! O homem de bigode ficou furioso e pediu-se para ele se retirar, por meio de palavrões. Não era a primeira vez que um cliente careca reagia desse jeito.

Aproximou-se de uma senhora de alguma idade que estava tomando sol de bruços. Colocou os pentes de cores mais claras e com detalhes floridos na parte de frente da cesta, como foi instruído a fazer no curso de vendas. Agachou-se ao lado da espreguiçadeira. A senhora tem um cabelo radiante, mas acredito que ficaria ainda melhor se penteado com alguns desses pentes. A senhora abriu os olhos, encarou o sorriso do vendedor, olhou para a cesta de pentes, voltou para o vendedor e virou o pescoço para o outro lado, tentando pegar no sono novamente.

Deu uma olhada na cesta de pentes. Estava idêntica a cesta de manhã, um pouco mais suja talvez. Olhou seu reflexo no vidro de uma perua. Seu sorriso permanecia o mesmo. O Sol se punha atrás do Mar, fazendo um pôr-de-sol bastante bonito. Um bom escritor ou poeta certamente saberia descrever esse cenário de uma maneira bastante agrádavel e lúdica ao seu leitor. Ele não lia muitos livros (nem poucos, nem nenhum) mas achou a cena bastante bonita também. Ficou um bom tempo parado admirando a praia.


Ele não era muito bom vendedor.

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