quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Fila

Pessoas esperam em uma fila.

-É aqui a fila?
-Sim.
-Ótimo, achei que tinha me enganado.
-É aqui mesmo.
-Há quanto tempo você tá aqui?
-Eu não saberia dizer.
-É? Você acha que vai demorar muito?
-Não sei.
-Mas tá andando rápido pelo menos?
-Não prestei atenção.
-Não quero perder meu tempo aqui.
-Besteira. Todo mundo tem que pegar a fila.
-Eu sei, mas não queria fazer isso agora.
-Ninguém quer.
-Nem todos. Você parece não se incomodar.
-Por que deveria? É só uma fila.
-Mas você não tá nem ansioso pra chegar sua vez?
-Daqui a pouco chega, é só esperar.

Não havia relógios mas algum tempo se passou.

-Deve ter alguma coisa errada, ainda não nos mexemos.
-É assim mesmo.
-Não é possível que seja assim, eu vou descobrir o que tá acontecendo.
-Quando descobrir me avisa.

...

-E então, como foi?
-Olha, eu falei com muitas pessoas da fila, que também estavam esperando.
-E o que descobriu?
-Acho que ela é assim mesmo, tem que esperar.
-Eu te falei. Basta esperar.
-É, foi o que todos disseram.
-Sim.
-Só uma coisa que não entendi direito, que ninguém soube me explicar muito bem.
-Diga.
-O que exatamente devemos esperar?
-Ué, estamos esperando chegar a nossa vez na fila.
-Sim, mas e aí? O que acontece quando chega a nossa vez?
-Quando chega nossa vez a gente não precisa mais esperar.

Nem os relógios saberiam dizer quanto tempo se passou, mas a vez deles chegou. Depois de toda
essa espera, finalmente era a hora de descobrir o que os aguardaria no final da fila. Olharam-se uma última vez e caminharam confiantemente. Na sua frente, havia apenas uma pequena mesa redonda de madeira, que servia de apoio a uma máquina da qual saiam papéis. Cada um puxou um. Era uma senha.

Pessoas ordenadamente esperam em uma fila.

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Bem comum

São 6:02 e o dia de trabalha acabou de começar. Centenas de homens engravatados e carecas infestam a grande e bem iluminada sala. O barulho é ensurdecedor. Gritos, telefonemas, campainhas, alarmes, clicks. Incessantemente correm os homens, carregendo pilhas de papéis enquanto tentam abrir caminho pela multidão. Sem pausas para tomar fôlego, eles checam emails, leem cartas e atendem telefonemas. As mensagens chegam ininterruptamente: "Não vejo a hora de acabar" "só mais 5 minutinhos" "espero que passe voando" "um segundo, já vou"  "assim eu vou chegar atrasado" "bem que podia chegar logo". No centro da sala, um gigantesco relógio de mármore bate sem parar, ao qual os homens dirigem seus olhares preocupados a todo instante. Todos gritam em direção a um pequenino homem barbudo, sentado num banquinho ao lado do relógio, que gira uma velha manivela de madeira continuamente. Só se ouvem duas coisas no ambiente: "Mais rápido!". "Mais devagar!". Nenhum dia de trabalho é fácil no Ministério do Tempo.